Nodar Tensions

O projecto resulta de um percurso realizado pelo artista ao longo do rio Paiva, desde Nodar até à nascente em Carapito, Moimenta da Beira. Em Nodar e ao longo do trajecto foram registados sons,fotografias e vídeo que foram apresentados na forma de uma instalação mixed-media. Os elementos que recolhi são o reflexo de uma visão subjectiva da relação entre um corpo e a paisagem, das contingências e memórias de uma viagem contra-corrente ao interiorde um rio.

Inicialmente havia uma palavra relacionada com a memória que tinha da aldeia, que era a palavra “interior”. A percepção da geografia, da forma como a aldeia está rodeada por montanhas, mas também como se localiza longe da costa. Sobretudo relacionava-a com as ideias de luz, de interioridade e de espaço interior. Ao mesmo tempo gostava da ideia de fazer caminhadas, de sofrer com o percurso.

Interessava-me a relação das pessoas com o território em tensão com a memória, a forma como, não havendo já necessidade de realizar caminhadas como antes, a paisagem se vai fechando sobre o lugar onde se vive e se trabalha. O caminho só existe quando alguém o percorre.

Em Nodar a presença do rio é muito forte, no entanto não sabemos donde ele provém. A minha caminhada partiu da ideia de que o rio marca uma linha e deste movimento ser em direcção ao interior. A nascente era o meu objectivo. E comecei a pensar como poderia tornar isto visível. Não podia trabalhar com muitos meios durante a caminhada porque a sua função é exclusivamente progredir. Por isso tinha de aproveitar os momentos de paragem para trabalhar. Arranjei os mapas para ter o território bem designado, pensei em registar a minha localização sempre que parasse,tirando uma fotografia, e no final fazer uma filmagem do local da nascente. Por outro lado,interessavam-me os sons desta região e queria fazer também fonografia.

Pensei em mostrar alguns dos materiais que faço, mas também alguns que levei: o mapa que pretendia mostrar no chão com os lugares por onde parei, o colchão onde dormi serviu para as pessoas se ajoelharem para ver o mapa, qualquer elemento que tenha tido uma função na caminhada. Interessava-me um espaço recolhido para acolher as projecções tanto das filmagens que fiz como também das imagens das paragens. A ideia foi criar um espaço interior como um abrigo,ou uma paragem.

Vi muitas coisas… Vi uma parte do meu país que não conhecia. Vi um país novo. Tive uma experiência do tempo diferente do que se tivesse ficado na residência artística, sem intervalos e sem conforto.

Andando durante algum tempo por entre estes montes e vales, percebemos que a religiosidade vivida por estas gentes é talvez mais autêntica. A existência ainda de ermidas, locais de paragem,abrigos, porque ainda existe a noite, os perigos da terra. Houve mesmo quem julgasse que aquilo que eu fazia se devia a uma promessa e de facto eu considero que existe essa carga no fazer artístico, quando me proponho levar a cabo um projecto.

(1981, Lisboa) Estudou literatura na faculdade de letras, concluiu o Curso Avançado de Fotografiana Ar.Co. Nos seus projectos trabalha com fotografia, vídeo, composição sonora (na área dos “fieldrecordings” e da música concreta) objectos e instalações pluridisciplinares. O ponto focal do seu trabalho é a questão da percepção e dos mecanismos fenomenológicos da consciência, bem como as noções particulares de cisão e fronteira.

Francisco Janes foi o vencedor da Bolsa Ernesto de Sousa relativa a 2008, atribuída pela Experimental Intermedia Foundation de Phil Niblock e pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento.

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