Plantas Faladas: Arquivo de Memória Vegetal

Desde o seu nascimento, os habitantes atuais destas aldeias são introduzidos numa série de relações mediante as quais obtêm alimento, roupa e refúgio; simbolizam as transições mais fortes no seu percurso vital, transformam o seu próprio entorno com trabalhos e ferramentas, unem, separam, cuidam e enxertam plantas domesticadas e silvestres, intercambiadas e selecionadas; semeiam sementes escolhidas, em hortas, em terras de lavrar e jardins; engalanam altares e lares; rogam proteção contra tormentas, energizam e purificam com vapores, fumos e banhos; jogam com fibras, madeiras, frutas e flores, construindo-se a si mesmos e ao seu lugar no mundo. Ao longo do ano de 2019, realizaram-se nas aldeias de Várzea de Calde e Cabrum uma série de entrevistas a habitantes que nasceram entre as décadas de 1930 e de 1990, homens e mulheres, com o objetivo de conversar sobre os diversos vínculos existentes com o mundo vegetal, os quais se desenvolveram ao longo do tempo. Partindo deste objetivo, editaram-se uma série de relatos que se colocam agora à disposição do público. Estes são parte de uma trama que designamos por arquivo, na qual se relacionam, através da tecnologia digital, memórias individuais, familiares e coletivas enraizadas no mesmo território.

O projeto PLANTAS FALADAS: ARQUIVO DE MEMÓRIA VEGETAL culminou na inauguração em dia 29 de novembro 2019, no Museu do Linho de Várzea de Calde, de uma exposição mixed-media que partiu precisamente do conceito de arquivo, refletindo sobre a conjugação possível entre um catálogo de documentos arquivados e a presença evocadora de elementos materiais, de plantas, de imagens e de sons ligados às plantas e seus usos locais. Esta exposição é dedicada aos que dormiram em colchões de palha de centeio, aos que vestiram e vestem alguma roupa de linho, aos que pensam no que comem, aos que escolhem o que comem ou comem o que podem, a todos aqueles que suaram e deixaram de dormir para produzir alimentos para a sua família e seus animais, aos que conservam uma ferramenta ou um móvel feito por algum familiar, aos que passaram frio, calçavam tamancos, construíram os seus próprios brinquedos, se comoveram contemplando a paisagem que habitam, roubam uma flor ou não esquecem um aroma.

Ana Rodríguez nasceu em Montevidéu em 1975, vive e pesquisa em contextos rurais desde 2001, ano em que se estabeleceu em Tacuarembó, no norte do Uruguai. Antropóloga formada pela Universidade da República do Uruguai. Cursou o mestrado em Teoria e Prática do Documentário Criativo na Universidade Autónoma de Barcelona. Formou parte da equipa docente do Núcleo de Estudos Rurais (Sede de Tacuarembó da Universidade da Repúblicado Uruguai) entre 2016 e 2018. Criou materiais didáticos audiovisuais sobre género e ruralidade para Faculdade de Agronomia do Uruguai (2016), um CD de contos de tradição oral com paisagens sonoras (Los cuentos de Mamá Carolina, 2013), criou o Mapa Sonoro do Uruguai (2016), sendo, desde 2013, artista e investigadora junto da Binaural Nodar. Ana Rodríguez tem vindo a trabalhar com memória, som e oralidade em contextos rurais.

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